
AVALIAÇÃO SENSORIAL DE KEFIR CREMOSO ADICIONADO DE FRUTAS VERMELHAS APLICANDO O MÉTODO FOCUS GROUP
DOI: 10.53934/agronfy-2025-04-08
ISBN: 978-65-85062-25-1
Este capítulo faz parte da coletânea de trabalhos apresentados no II CONGRESSO PARAIBANO DE PROCESSAMENTO E TECNOLOGIA DE ALIMENTOS – Acesse ele aqui.
Cruz, EMILY BEZERRA Coutinho1; Bezerra, TALIANA KÊNIA Alencar2; Dias, JULIANA TATIAIA de Morais Dias3.
1Estudante, Pós-Graduação de Engenharia Agrícola/Universidade Federal de Campina Grande.
2Professora, Departamento de Engenharia de Alimentos/Universidade Federal da Paraíba.
3Estudante, Pós-Graduação de Engenharia Agrícola/Universidade Federal de Campina Grande.
*E-mail para correspondência: coutinhoemily@gmail.com
Resumo Gráfico
- Introdução
O interesse dos consumidores por alimentos nutricionalmente reformulados e com valores agregados, como compostos bioativos, tem crescido significativamente nos últimos anos. Entre os alimentos funcionais, os produtos lácteos se destacam, representando mais de 40% desse mercado devido à sua ampla aceitação e versatilidade (Turkmen, Akal e Özer, 2019; Bimbo et al., 2017). São frequentemente percebidos como alimentos naturais, saudáveis e ricos em nutrientes essenciais. Nesse contexto, o kefir cremoso surge como uma matriz promissora para a incorporação de frutas vermelhas, com o objetivo de potencializar suas propriedades funcionais e aumentar seu valor comercial (Kandylis et al., 2021).
As percepções sensoriais de alimentos desempenham um papel crucial na aceitação do consumidor e podem ser influenciadas por diversos fatores, como expectativas, interações pessoais com o produto, memórias afetivas e até o preço de mercado. Para compreender essas percepções de forma mais profunda, a aplicação de metodologias qualitativas se torna indispensável (Lazar et al., 2017; Batista et al., 2023). Essas abordagens complementam a análise estatística ao oferecer uma perspectiva mais detalhada sobre as preferências dos consumidores. Métodos como perfil de sabor, análise descritiva qualitativa e perfil de textura têm sido amplamente utilizados. Além disso, ferramentas como entrevistas e grupos focais permitem uma interação direta com os consumidores, explorando suas impressões e comportamentos em relação aos produtos avaliados.
O método focus group é uma técnica de pesquisa qualitativa amplamente utilizada para reunir indivíduos e promover discussões sobre percepções, crenças e atitudes em relação a um determinado tema, produto ou serviço. Sob a mediação de um moderador, os participantes interagem entre si, permitindo a coleta de dados ricos e detalhados. Essa abordagem é especialmente relevante em estudos sensoriais, pois possibilita a identificação de preferências, sugestões de melhoria e tendências de consumo, auxiliando no desenvolvimento de produtos alinhados às demandas do mercado.
Nos últimos anos, o focus group tem ganhado popularidade devido à sua capacidade de gerar informações qualitativas profundas e contextualizadas (Sachdeva; Kumar Amit; Eram, 2024). Sua estrutura metodológica é fundamentada na atuação do moderador, que conduz a discussão, e na análise dos dados coletados, extraindo padrões e insights relevantes (Sachdeva et al., 2024; Dil et al., 2024). Estudos anteriores demonstram sua eficácia na compreensão do comportamento do consumidor e na formulação de estratégias voltadas para a inovação e aprimoramento de produtos.
Berrondo e Gámbaro (2023) destacam o focus group como uma ferramenta essencial para captar insights sobre inovação no setor alimentício, permitindo que consumidores expressem suas opiniões de forma interativa e auxiliando na identificação de atributos valorizados. Moreira et al. (2020) aplicaram essa metodologia na caracterização sensorial da carne de sol, analisando sabor, textura e aceitação do produto. Os resultados evidenciam a importância do focus group na avaliação de alimentos tradicionais, contribuindo para melhorias e adaptações alinhadas às preferências do consumidor, reforçando seu valor na análise sensorial e no desenvolvimento de produtos para o mercado.
Neste estudo, o método qualitativo de Focus Group foi aplicado para investigar as percepções sensoriais e o comportamento de consumidores em relação ao kefir cremoso formulado com frutas vermelhas. A abordagem buscou identificar as preferências e insights dos participantes, contribuindo para o desenvolvimento de um produto que atenda às expectativas do mercado e potencialize seus atributos funcionais e sensoriais.
- Metodologia
Este estudo utilizou a metodologia de grupos focais descrita por Casey e Krueger (1994) para avaliar as percepções sensoriais dos participantes em relação aos atributos de aparência, odor, sabor, cremosidade e avaliação global do produto.
- Descrição do Material Utilizado:
As amostras avaliadas consistiram em cinco formulações de kefir cremoso: kefir controle (KC), kefir com adição de açaí (KA), kefir com adição de morango (KM), kefir com adição de uva (KU) e kefir com uma mistura de frutas vermelhas (KMIX). As formulações foram preparadas seguindo os mesmos processos padronizados de produção para garantir consistência entre as amostras.
- Recrutamento dos Avaliadores:
Os participantes do grupo focal foram selecionados com base em seu consumo regular de kefir ou outros produtos lácteos fermentados. Foram recrutados 20 avaliadores com nível superior de escolaridade. A seleção buscou garantir um público homogêneo quanto à familiaridade com produtos lácteos, promovendo uma discussão mais direcionada e relevante para o objetivo do estudo.
- Sessão Experimental
O experimento foi realizado em uma única sessão com duração de 50 minutos, conduzida em um laboratório de análise sensorial adequado, com disposição dos participantes em círculo. Cada participante recebeu as cinco amostras de kefir para avaliação sensorial, seguindo a sequência previamente estabelecida.
O roteiro utilizado incluiu perguntas orientadoras que visavam estimular a discussão e identificar barreiras, preferências e percepções sensoriais relacionadas ao produto desenvolvido. Durante a sessão, os participantes foram incentivados a compartilhar suas impressões qualitativas sobre os atributos avaliados as descrições dos termos para os atributos sensoriais foram definidas para um melhor direcionamento dos avaliadores conforme apresentado na Tabela 1.
Tabela 1 – Definição dos termos para direcionamento na avaliação dos atributos sensoriais do kefir cremoso adicionado de frutas vermelhas.
Atributos avaliados | Descrições dos atributos |
Aparência | Aqui será considerado o primeiro contato visual com o produto, sendo frequentemente influenciada por padrões associados a expectativas culturais e memórias afetivas. A textura visual, cor e uniformidade devem ser os principais aspectos avaliados. |
Odor | O olfato está intimamente ligado à memória e às emoções, avalie a amostra relacionando-a com suas experiências prévias, intensidade e características olfativas, como o consumo de produtos semelhantes (ex.: iogurte, coalhada, leite fermentado). |
Sabor | Avalie de acordo com suas as percepções individuais de doçura, acidez e o grau de familiaridade com o consumo de produtos semelhante (ex.: iogurte ou coalhada, leite fermentado). |
Cremosidade | Avalie de acordo com a textura percebida ao paladar |
Avaliação Global | Este atributo sintetiza a percepção geral , considerando todos os fatores sensoriais e a experiência como um todo. |
Fonte: Elaborada pelo autor
- Coleta de dados
As percepções sensoriais foram registradas durante a sessão, com destaque para os fatores que influenciaram a aceitação ou rejeição dos produtos, bem como sugestões para possíveis melhorias. Essa abordagem qualitativa permitiu uma análise detalhada e aprofundada das preferências dos consumidores, fornecendo informações valiosas para o aperfeiçoamento do produto desenvolvido.
- Resultados e discussões
Na aparência, o KA foi descrito como menos cremoso devido à composição físico-química do açaí (pH e pectina), enquanto o KC teve melhor textura visual. A coloração escura do KA foi atrativa, associada ao aumento do parâmetro a* e redução do L*. O KM apresentou cores inconsistentes e partículas visíveis, interpretadas como negativas. Para o odor, o KC foi associado ao cheiro de produtos lácteos fermentados, como iogurte natural ou coalhado. Entre as frutas, o açaí e a uva destacaram-se por odores característicos, enquanto o morango teve impacto olfativo menos evidente.
O KMIX apresentou predominância do cheiro de açaí. No sabor, o KC foi percebido como menos doce, refletindo a ausência de sacarose e frutose. As amostras KM e KU foram descritas como mais equilibradas, combinando acidez e doçura. Quanto à cremosidade, o KC foi unanimemente considerado o mais cremoso, seguido por KM, KU, KMIX e KA. O KM foi a amostra mais preferida, seguida por KC e KU.
As percepções sensoriais das amostras de kefir foram influenciadas por diversos fatores, incluindo aspectos comportamentais dos avaliados, expectativas, memórias afetivas e preconceitos estabelecidos em relação ao produto. Esses elementos destacam a necessidade de uma abordagem integrada para obter resultados consistentes e relevantes.
As percepções sensoriais das amostras de kefir foram altamente influenciadas por diversos fatores que vão além das características intrínsecas do produto. Entre esses fatores, destacam-se os comportamentos individuais dos avaliados no momento da análise, como expectativas prévias em relação ao produto, memórias afetivas que podem remeter a experiências anteriores e preconceitos estabelecidos, como preferências pessoais ou rejeições a determinados ingredientes ou alimentos. Esses elementos subjetivos desempenham um papel significativo na maneira como os atributos sensoriais são percebidos, ressaltando a complexidade da análise sensorial e a importância de compreender as interações entre o avaliador e o produto.
Para abordar essa complexidade e obter resultados mais consistentes e relevantes, foi necessária uma abordagem integrada. O método Focus Group mostrou uma ferramenta eficaz para captar tanto as percepções individuais quanto as coletivas, fornecendo informações mais aprofundadas sobre os atributos sensoriais do produto. A discussão em grupo permitiu explorar percepções subjetivas e avaliar como diferentes experiências e expectativas influenciaram a avaliação sensorial.
Os atributos analisados foram aparência, odor, sabor, cremosidade e avaliação global, escolhidos por sua relevância na acessibilidade de produtos lácteos fermentados. Essas partes representam aspectos sensoriais fundamentais que influenciam diretamente a decisão de compra e o consumo do kefir.
Ao longo da análise, a interação entre os diferentes atributos e os fatores subjetivos destacados revelou a complexidade da percepção sensorial, demonstrando como aspectos físicos do produto, como textura, cor e especificidade, interagem com as expectativas e experiências individuais dos avaliados. Essa inter-relação influencia diretamente as preferências e avaliações, destacando a importância de compreender o consumidor de forma
Além disso, foi possível identificar que memórias afetivas, como associações com alimentos previamente consumidos, e preconceitos estabelecidos em relação ao perfil sensorial das frutas incluídas desempenharam papéis importantes na formação das opiniões. Por exemplo, o kefir com açaí foi avaliado de maneira divergente, devido à associação do açaí com produtos açucarados, enquanto o kefir com morango apresentou desafios relacionados à expectativa de cor e odor típicos de produtos industrializados
Esses resultados apontam para a necessidade de considerar tanto as propriedades físico-químicas das formulações quanto os aspectos subjetivos dos consumidores ao desenvolver novos produtos. Estratégias como a personalização de perfis sensoriais e a educação do consumidor sobre as características naturais do kefir e das frutas podem melhorar a acessibilidade e ampliar o mercado de produtos lácteos fermentados funcionais.
- Aparência
Os avaliadores destacaram uma textura visual agradável e uma cor atrativo para as amostras, com exceção do kefir com açaí (KA), que foi considerado menos cremoso em comparação com demais. Essa diferença pode ser atribuída à composição física e química do açaí, como o pH e a presença de pectina, que afetaram as partículas da calda e, consequentemente, a textura do produto. O kefir com morango (KM) também apresentou limitações na uniformidade de cor, sendo descrito como menos específico da fruta adicionada, possivelmente devido à ausência de corantes artificiais frequentemente associados a produtos comerciais de morango. - Odor
Os avaliadores associaram o odor do kefir a características típicas de produtos lácteos fermentados, como iogurte natural ou coalhada. Entre as formulações com frutas, a uva (KU) e o açaí (KA) apresentaram odor característico das respectivas frutas, enquanto a mistura de frutas (KMIX) teve maior predominância do aroma de açaí. Já o kefir de morango (KM) foi descrito como semelhante ao kefir controle em termos de odor, indicando uma baixa influência da fruta adicionada nesse atributo.
- Sabor
A percepção de sabor varia entre as formulações. O kefir controle (KC), sem adição de calda, foi descrito como menos adocicado devido à ausência de sacarose e frutose, ressaltando o sabor natural do produto. Avaliadores que consomem kefir regularmente dizem que na forma cremosa o sabor foi intensificado, relatando que a influência do processamento na análise sensorial.
As amostras KM (morango) e KU (uva) foram descritas como mais doces e com sabores frutados específicos, atribuídas às caldas adicionadas. Quanto a amostra KA (açaí) apresentou menor acidez e uma maior discordância entre os avaliados: 11 não gostaram, enquanto 9 gostaram. Esse resultado pode ser explicado pela familiaridade dos avaliados com o açaí, que normalmente é consumido como um xarope adoçado, associado ao relato de não consumo de açaí na forma natural pelos participantes. A amostra KMIX destacou-se pelo sabor de açaí predominantemente, alinhado com as percepções de odor.
- Cremosidade
A cremosidade foi outro parâmetro fundamental avaliado. A amostra KC foi considerada a mais cremosa, enquanto a KA foi descrita como a menos cremosa. Essa diferença foi confirmada pelos dados reológicos, reforçando a importância da reologia para a caracterização sensorial dos produtos. Durante a discussão, os avaliadores ordenaram as amostras em termos de cremosidade, na escala dá mais para a menos cremosa: KC, KM, KU, KMIX e KA.
- Preferência Global
A preferência varia significativamente entre os avaliados. Entre as amostras saborizadas, KM foi a mais preferida, seguida por KC e KU. A amostra KA foi a menos preferida, com o relato de que alguns participantes não faziam o consumo de açaí regularmente. Apesar das variações nas opções individuais, todas as formulações foram consideradas satisfatórias em termos de atributos sensoriais.
Esses resultados indicam que a sensorial acessível do kefir cremoso é extremamente influenciada pela familiaridade dos consumidores com os ingredientes aumentados e pela memória sensorial associada aos produtos. As informações fornecidas fornecem dados que servem para ajustes no desenvolvimento de produtos lácteos no âmbito de que atender melhor as expectativas dos consumidores e demandas de mercado.
- Considerações Finais
De forma geral, os resultados demonstraram que todas as formulações de kefir cremoso com adição de frutas foram sensorialmente satisfatórias, evidenciando seu potencial para atender às demandas do mercado por produtos lácteos fermentados funcionais. A interação entre os atributos sensoriais analisados – aparência, odor, sabor, cremosidade e avaliação global – e os fatores subjetivos dos avaliados destacados a complexidade envolvida na percepção do produto, bem como a influência de memórias afetivas.
A formulação com morango foi a mais preferida, reforçando as possibilidades de sabores familiares, enquanto o kefir com açaí apresentou opiniões divergentes, refletindo variações nas opções individuais e na familiaridade com o consumo do ingrediente. Essas observações indicam a importância de que existem necessidades específicas para atender a diferentes perfis de consumidores, como a intensificação de sabores ou a harmonização da textura, sem comprometer as características funcionais do produto.
Os resultados deste estudo oferecem contribuições relevantes para o desenvolvimento de produtos inovadores no setor de alimentos funcionais, ao mesmo tempo em que evidenciam a importância de compreender as interações entre propriedades físico-químicas e sensoriais e as percepções dos consumidores.
Como perspectivas futuras, recomenda-se a realização de estudos mais amplos, incluindo uma amostra diversificada de consumidores e diferentes condições de consumo, para explorar de forma mais abrangente as variáveis que influenciam a limitações do kefir cremoso.
Além disso, investigações adicionais puderam avaliar a influência de composições alternativas de frutas e adoçantes, bem como explorar estratégias para educar os consumidores sobre as características naturais do kefir, ampliando assim sua acessibilidade no mercado e fortalecendo sua posição como um produto inovador e funcional.
Ao integrar estratégias que alinhem as preferências sensoriais dos consumidores com os benefícios nutricionais e funcionais do kefir, este estudo contribui não apenas para o avanço no desenvolvimento de alimentos fermentados, mas também para a promoção de hábitos alimentares mais saudáveis.
5. Referências Bibliográficas
Berrondo, V., & Gámbaro, A. (2023). Innovation in focus group research. American Journal of Food Science and Technology, 11 (2), 44-48. https://doi.org/10.12691/ajfst-11-2-3
Bimbo, F., Bonanno, A., Nocella, G., Viscecchia, R., Nardone, G., De Devitiis, B., & Carlucci, D. (2017). Consumers’ acceptance and preferences for nutrition-modified and functional dairy products: A systematic review. Appetite, 113, 141-154. https://doi.org/10.1016/j.appet.2017.02.031
Casey, M. A., & Krueger, R. A. (1994). Focus groups: A practical guide for applied research (2nd ed.). SAGE Publications.
Dil, N., Khan, M., & Ali, S. (2024). Use and implementation of focus groups. Medical Teacher. https://doi.org/10.1080/0142159x.2024.2304451
Moreira, R. T., Farias, S. M. O. C., Coutinho, E. P., Fernandes, R. P. P., & Costa, S. S. (2020). Avaliação físico-química e caracterização sensorial por meio de focus group de carne de sol. Revista do Instituto Adolfo Lutz, 79, e1789. https://www.researchgate.net/publication/357822032
Sachdeva, S., Kumar Amit, T., & Eram, P. (2024). Discussão em grupo focal: uma ferramenta qualitativa emergente para pesquisa educacional. International Journal of Research and Review, 11 (9), 302–308. https://doi.org/10.52403/ijrr.20240932
Türkmen, N., Akal, C., & Özer, B. (2019). Dairy-based probiotic beverages: A review. Journal of Functional Foods, 53, 62-75. https://doi.org/10.1016/j.jff.2018.12.004
Kandylis, P., Dimitrellou, D., & Moschakis, T. (2021). Recent applications of grapes and their derivatives in dairy products. Trends in Food Science & Technology, 114, 696-711. https://doi.org/10.1016/j.tifs.2021.05.029