ANÁLISE QUANTITATIVA DE COMPOSTOS FENÓLICOS EMGRÃOS DE CAFÉ CRU E TORRA TRADICIONAL

Este capítulo faz parte da coletânea de trabalhos apresentados na VII Semana de Alimentos (Semal), publicado no livro: Avanços e Pesquisas em Ciência dos Alimentos: Novas Tendências e Aplicações. – Acesse ele aqui.

DOI: 10.53934/agronfy-2025-03-31

ISBN:

Artur Braga Brasil *; Rodrigo Vieira da Silva ;Ellen Godinho Pinto ; Wiaslan Figueiredo Martins ; Ana Paula Stort Fernandes ; Dayana Silva Batista Soares

*Autor correspondente (Corresponding author) –Email: ellen.godinho@ifgoiano.edu.br

RESUMO

O café constitui-se numa das commodities mais importantes do mundo e possui grande importância na história do Brasil. Nas últimas décadas, o café vem obtendo ainda mais destaque em função da qualidade quanto a origem, forma de cultivo, tipo de torra, moagem e seus diferentes modos de preparo. Os compostos fenólicos presentes nos grãos de café influenciam na sua qualidade de bebida e muitos deles são benéficos a saúde humana, tornando interessante a presença da maior quantidade dos mesmos. Diante desse contexto, esse trabalho teve como objetivo avaliar os níveis de compostos fenólicos que ficaram retidos no café (Coffea arabica) quando foi utilizado grãos crus e torrados em diferentes extratos. De acordo com os resultados foi possível compreender que o café torrado apresentou maior teor dos compostos fenólicos e a solução cetônica destacou-se ao proporcionar uma extração maior que nas outras estudadas.

Palavras-chave: Cafeeiro; qualidade de bebida, fenóis; soluções extratoras

INTRODUÇÃO

O Brasil se destaca como o maior produtor e exportador mundial de café a quase dois séculos. A safra de 2023 foi de 45,34 milhões de sacas colhidas e um total de 36,3 milhões de sacas exportadas em 2023. Além disso, o Brasil é o segundo maior consumidor mundial de café, acima de 20 milhões de sacas, sendo 6,12 kg de café cru ou 4,89 kg de café torrado, por pessoa por ano (1). O cultivo de café arábica é recomendado para regiões com temperaturas médias anuais entre 18 e 22 °C, geralmente situadas em altitudes superiores a 500 m (2).

O Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento, por meio da Instrução Normativa nº 8, de 11 de junho de 2003, aprovou o Regulamento Técnico de Identidade e de Qualidade para a Classificação do Café Beneficiado Grão Cru. Nesse Regulamento objetiva-se definir as características de identidade e de qualidade para a classificação do Café Beneficiado Grão Cru. O Café Beneficiado Grão Cru é classificado em categoria, subcategoria, grupo, subgrupo, classe e tipo, segundo a espécie, formato do grão e a granulometria, o aroma e o sabor, a bebida, a cor e a qualidade, respectivamente (3).

O consumo de café ainda permanece como hábito entre a população com idade acima dos 30 anos. Os consumidores de café buscam satisfazer não só as necessidades fisiológicas, mas também as psicológicas como reconhecimento, autoestima e necessidade de relacionamento, por meio da compra e ato de fazer café (3).

O café é um alimento complexo, e sua composição química pode ser afetada por diversos fatores como, a genética do grão de café, condições de manejo pré e pós-colheita, torrefação, blend e preparo da bebida (4).

O consumo elevado de café desperta interesse em torno das propriedades químicas destes grãos; algumas das mais conhecidas são os polifenóis, cafeína, ácido clorogênico (ACG), lipídeos, minerais e carboidratos. Alguns estudos sugerem os fenólicos conferem ao café ação antimutagênica, antioxidante, antibiótica e protetiva contra doenças neurodegenerativas e cardiovasculares. Dentre os efeitos promovidos por essas substâncias, destacam a inibição da biossíntesse dos leucotrienos que atuam em processos inflamatórios, tropismo pela microflora intestinal, estimulação do sistema nervoso central (SNC) (5).

A prevenção da carcinogênese é destacada pela presença de antioxidantes como os ácidos clorogênicos e minerais que evitam a degradação e alteração das células, prevenindo o surgimento de mutações que resultem em tumores malignos. Eles atuam como reguladores da proliferação e apoptose de células cancerosas em interferir em passos importantes da síntese do DNA e na divisão celular (6).

Os compostos fenólicos, são bem conhecidos por suas características antioxidantes in vitro. Os ácidos clorogênicos constituem um dos principais grupos entre os fenólicos e têm apresentado várias outras características farmacológicas importantes em estudos in vitro e em animais. Embora os grãos verdes do café contenham os maiores teores de ACG encontrados na literatura, durante seu processamento esses compostos sofrem acentuada modificação (7).

Após o processo de torra do café a bebida pode passar a apresentar características sensoriais diferentes, na literatura já foi confirmado que apesar de alguns compostos fenólicos serem destruídos com a torra, participam da reação de Maillard, originando vários produtos. Esses produtos também podem apresentar propriedades antioxidantes, com mecanismos de ação que envolvem a quelação de metais, interrupção de reações em cadeia pela doação de um átomo de hidrogênio, reduzindo hidroperóxidos a produtos não radiculares e captura do radical hidroxil (5). Em contrapartida alguns materiais de estudo sugerem que a bebida com o grão cru não apresenta mudanças significativas em relação à quantidade de compostos fenólicos, apesar de possuir maiores quantidades.

Diante do exposto, este trabalho objetivou avaliar o teor de compostos fenólicos no café crú e torrado através de três diferentes soluções extratoras.

MATERIAL E MÉTODOS

Coleta de amostras (Coffea arabica)

Para a avaliação dos compostos fenólicos foi coletado amostras de café, colhida a campo no ponto de maturação da cereja, apresentando em toda proporção do fruto coloração avermelhada. Após a colheita os grãos coletados foram expostos sobre uma lona com o objetivo de desidratá-los até atingir coloração preta e aspecto de seco, em seguida serem levados ao laboratório.

Preparação da amostra

No laboratório de cafeicultura para a realização dos testes, em metade da amostra foram utilizados grãos crus (apenas desidratados naturalmente) e a outra metade dos grãosforam submetidos a torra tradicional (220-250 °C), já que devido à importância do setor cafeeiro em escala global, vale destacar que a qualidade do café torrado e moído é um fator decisivo para comercialização e está diretamente relacionada com sua composição físicoquímica (8). Na Figura 1 pode-se observar o café crú e o café após a torra.

Análises físico-química

Foram realizadas as análises de pH, umidade, atividade de água (Aw) e sólidos solúveis totais, seguindo as diretrizes do Instituto Adolfo Lutz – IAL (9).

Obtenção dos extratos

Os extratos aquosos, hidroalcoólicos e cetônicos foram obtidos em sequência a partir das amostras obtidas em laboratório, compostas por 20 g de cada amostra (grãos crus e grãos torrados) e 100 mL da solução extratora e submetidos à agitação por uma hora, para posterior filtração a vácuo (10).

Determinação dos compostos fenólicos

A determinação dos fenólicos totais seguiu a metodologia descrita por Swain e Hills (10). Foi adicionado em um balão volumétrico de 10 mL, 0,5 mL de amostra, em triplicata, do extrato hidroalcoólico, aquoso e/ou acetônico, 8 mL de água destilada e 0,5 mL do reagente de Follin Denis. Em seguida, a solução foi homogeneizada e deixou-se em repouso por 3 min. Decorrido esse tempo, acrescentou-se 1 mL de solução saturada de carbonato de sódio anidro. A solução ficou em repouso por 1 hora e logo após foram realizadas as leituras de absorbâncias em espectrofotômetro (Coleman 33 D) a 720 nm. A leitura do branco foi realizada contendo os mesmos reagentes, menos a amostra. Utilizouse como padrão a solução de ácido gálico, em concentrações variando de 0 a 100 mg/mL. O cálculo do teor de fenólicos totais foi expresso em mg de ácido gálico/g de amostra (10).

Análise estatística

Para as análises estatísticas, foi utilizado o programa Assistat 7.7 no qual os dados obtidos foram submetidos ao teste t para as análises estre diferentes tipos de café (crú e torrado) e teste de Tukey a 5% para as diferentes soluções extratoras.

RESULTADOS E DISCUSSÃO

1. Análises Físico-Química do café cru e torrado

Ambas as amostras de café (cru e torrado) foram analisadas de acordo com suas características físico-químicas. Os resultados das análises foram discriminados na Tabela 1.

Os valores de pH na amostra de café cru ficaram por volta de 5,25 e do café torrado 4,95 estando na faixa de valores sugeridos (4,95 e 5,20) por (11). Segundo os autores este intervalo de pH do café torrado proporciona a produção de uma bebida com sabor palatável, sem excesso de acidez ou amargor (8).

Analisando os valores de umidade de ambas as amostras é possível notar que o café crú, como já esperado, apresentou valor acima do café torrado, devido ao processo de torra ter a evaporação da água livre presentes. Entretanto, ficando abaixo do recomendado (12), em que o máximo permitido é 12,5 %. Todavia, a mostra de café torrado ficou dentro dos padrões alcançando apenas 3,44%. Vale salientar que a umidade da semente do café apresenta influência direta na qualidade do produto (8).

Referente aos valores de Atividade de água apresentados no café cru e café torrado foram de 0,74 e 0,36 respectivamente, uma vez que valores superiores a 0,6 viabilizam o crescimento microbiano, a primeira amostra (café crú) se apresenta como de menor interesse por conta desse fator, pois com o armazenamento pode ocorrer contaminação devido ao teor de atividade de água, entretamto o café torrado teve Aw de 0,36 o que reduz a possibilidade de proliferação microbianae aumenta a vida útil do café (8).

Em relação aos sólidos solúveis totais, que da o teor de doçura da bebida, maior quantidade é desejada para assegurar o corpo da bebida e proporcionar maior rendimento (8). As duas amostras apresentaram boa porcentagem de sólidos solúveis (36 e 41,66 %), conforme preconizado por Brasil (2022), em que o valor mínimo de extrato aquoso deve ser de 20%, sendo que altos teores são desejáveis por atribuírem corpo à bebida de café (8).

2. Análises do Teor de Fenólicos no café cru e torrado

Na Tabela 2 encontra-se discriminado os valores do teor de compostos fenólicos em café crú e torrado, podendo observar o maior teor deste composto no café torrado, isso pode ter ocorrido devido ao processo de torra ocasionar a redução de água livre.

Nas soluções extratoras estudadas o teor de compostos fenólicos, na amostra de café crú a que se demonstrou mais eficiente foi o extrato aquoso, totalizando 68,07mg/100g de compostos fenólicos e o extrato cetônico para café crú teve a menor extração. Vale destacar que o extrato cetônico foi mais de 4 vezes superior no café torrado em relação ao café crú.

Em relação ao café torrado, a solução cetônica apresentou maior extração de fenólicos em valor absoluto, embora não tenha mostrado diferença estatisticamente significativa em comparação à solução aquosa, considerando um nível de significância de 5%.

CONCLUSÕES

O café torrado apresentou maior teor de compostos fenólicos em todos os extratos estudados, quando comparado ao café crú. Sendo que o café torrado no extrato cetônica teve maior teor de fenólicos, mas esta não se diferiu da solução aquosa estatisticamente a 5%.

Porém, nos extratos do café crú o teor de fenólicos foi superior no extrato aquoso, e no extrato cetônico foi o que teve menor extração de fenólicos.

REFERÊNCIAS

1. CONAB. Companhia Nacional de Abastecimento. Acompanhamento de safra brasileirigrãos- Safra 2022/2023. Brasília: Copanhia Nacional de Abastecimento 2023.

2. Agnoletti BZ, avaliação das propiedades físico-químicas de café arábica (coffea arabica) econilon (coffea canephora) clasificados quanto à qualidade da bebida. Alegre-ES,Universidade Federal Do Espirito Santo Centro De Ciências Agrárias Programa De PósGraduação Em Ciência E Tecnologia De Alimentos; 2015.

3. Ferrão MAG; Souza EMR; Fonseca AFA; Ferrão RG; Santos WG; Spadeto J. Indicação decultivares de café arábica para o estado do Espírito Santo e avaliação comparativa com oconilon em altitude elevada. Brasília, DF, EMBRAPA, 2021, 46.

4. Prado AS; Paiva EFF; Pereira RGFA; Sette RS; Silva JR; Paiva LC; Barbosa CA. Hábitosde consumo e preferência pelo tipo de bebida do café (coffea arabica l.) entre jovens deMachado/MG. Coffee Science, 2011, 6: 184-192.

5. Angelim CC; Brito PKS; Oliveira CSB; Marques PB. Análise comparativa de parâmetrosfísico-químicos e de compostos bioativos em cafés cafeinados e descafeinados. Research,Society and Development, 2021, 10: 1-10.

6. Bruzadelli RFD; Silva GG; Ribeiro IS. Avaliação de diferentes marcas e lotes de caféquanto a atividade antioxidante e composição fenólica. Josif 2022, 14° jornada científica etecnológica 11° simpósio de pós-graduação ISSN 2319-0124; 2022.

7. Farah A; Neves DF; Trugo LC; Rosenthal AB; Della modesta RCB. COMPOSTOSFENÓLICOS EM CAFÉ TORRADO. II Simpósio de Pesquisa dos Cafés do Brasil,Universidade Federal do Rio de Janeiro.

8. Abrahão AS; Pereira RGFA; Duarte SMS; Lima AR; Alvarenga DJ; Ferreira EB.COMPOSTOS BIOATIVOS E ATIVIDADE ANTIOXIDANTE DO CAFÉ (CoffeaarabicaL.). Ciênc. agrotec., 2010, 34:414-420,

9. INSTITUTO ADOLFO LUTZ. Normas Analíticas do Instituto Adolfo Lutz. Métodosquímicos e físicos para análise de alimentos. 4. Ed. São Paulo-SP; 2005.

10. Swain T; HILLS, W. E. The phenolic constituents of Punnus domestica.Iquantitativeanalysis of phenolics constituents. Journal of the Science of Food and Agriculture, London,1959, 19:63-68.

11. Ferreira BN; Bettani SR; Silva PPM; Baracat MNS; Silva JHN; Bernardi MRV. Análisefísico-química e sensorial do café torrado e moído tradicional e extraforte. R. bras. Tecnol.Agroindustr.,2023, 17: 4080-4099.

12. Anunciação AD, Silva Junior LS. Análise da qualidade do café obtido por torrefação avácuo. Revista CSBEA, 2016, 2: 1-7.

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